Foto de capa – Imagem do Nilo Peçanha Disponível na Homepage do Grande Oriente do Brasil, junto a imagem de seu texto constante no boletim da mesma Obediência de junho de 1918.
Em comemoração ao dia de São João Batista, no ultimo 24 de junho (2018) e aos 196 anos da data de fundação do Grande Oriente do Brasil, completados dia 17 do citado mês, resolvi agraciar os Irmãos com algo especial. Por este motivo procurei algo que representasse nosso anseio em relação à sociedade e a nossa busca constante na promoção da verdade e do progresso social.
Revirando os boletins antigos de nossa Augusta Fraternidade, me deparei com um texto de Nilo Peçanha, enquanto Grão Mestre do Grande Oriente do Brasil, dirigido a Assembleia Geral desta Obediência, realizada no dia 24 de Junho de 1918.
Nilo Procópio Peçanha foi o 7º presidente do Brasil República e governou por pouco mais de um ano cinco meses. Ele assumiu o comando do País devido à morte de Afonso Pena, do qual ele era o Vice Presidente da República. Tinha como lema de governo “Paz e Amor”, e foi um grande incentivador da criação de escolas técnicas para classes menos favorecidas através do decreto 7.566 de 23 de setembro de 1909 denominadas “Escolas de Aprendizes Artífices”.
Vale salientar é que este decreto tem algumas peculiaridades que lembram os antigos estatutos das corporações de ofício, tais quais os que replicarei agora:
Art. 2º Nas Escolas de aprendizes Artifices, custeadas pela União, se procurará formar operarios e contra-mestres, ministrando-se o ensino pratico e os conhecimentos technicos necessarios aos menores que pretenderem aprender um officio, havendo para isso, até o numero de cinco, as officinas de trabalho manual ou mecanica que forem mais convenientes e necessarias no Estado em que funccionar a escola, consultadas, quanto possivel, as especialidades das industrias locaes.
Art. 6º Serão admittidos os individuos que o requererem dentro do prazo marcado para a matricula e que possuirem os seguintes requisitos, preferidos os desfavorecidos da fortuna: idade de 10 annos no minimo e de 13 annos no maximo; não soffrer o candidato molestia infecto-contagiosa, nem ter defeitos que o impossibilitem para o aprendizado de officio.
Coincidência ou não, Nilo Peçanha nesta época já era iniciado na Maçonaria e não seria difícil para ele ter conhecimento dos velhos estatutos das corporações de ofício que teriam dado origem a nossa fraternidade.
Imagem da Escola de Aprendizes Artifices. Disponível em:
https://portal1.iff.edu.br/conheca-o-iffluminense/galeria-de-fotos-do-historico/escola-de-aprendizes-e-artifices.jpg/image_view_fullscreen. Acesso em Julho de 2018.
Segundo Luiz Claudio Gonçalves Gomes (2004) “Nilo Peçanha pregava a valorização e a multiplicação das profissões técnicas, buscando desestigmatizar o ensino de ofícios da inferioridade social que o marcava e marginalizava”.
Agora que conhecemos um pouco do personagem, cem anos passados vamos afundo na transcrição do texto dirigido a Assembleia Geral do Grande Oriente do Brasil, que naquela época, além de resgatar a tradição da reunião anual no dia de São João Batista, servia como uma espécie de prestação de contas do Grão Mestre em exercício, do qual através de texto relatava a situação da obediência e apresentava os projetos que tinha executado do ano anterior até o momento. De forma a evitar confusão, a partir de agora, todos os meus comentários e conclusões estarão em negrito. Outra observação a ser feita é que o texto foi transcrito com a grafia da época, então não estranhem.
Senhores Membros da Soberana Assembleia Geral
Poderosos Irmãos
É sempre grata aquelle que recebeu um mandato popular e compreende a honra da distincção conferida no que o elegeu, a ocasião propicia de dar contas do modo como se desempenha dos seus encargos e procura corresponder a confiança de que é depositário.
Mas, quando esse dever tem de ser cumprido perante uma tão selecta Assembléa, quando essa occasião se apresenta revestida de tão brilhante solemnidade, como a que aqui se realisa, cresce tanto de vulto esse agrado que bem se justifica o encontro realisado neste momento do Chefe do Executivo da Ordem com os senhores Membros do Poder Legislativo.
Por isso, tendo, pela primeira vez, de apresentar-vos, na Mensagem annual que a Constituição determina, a communicação dos assumptos que mais interessam nossa Sublime Ordem, senti satisfação em trazer-vos pessoalmente minhas saudações fraternaes, na hora em que daes inicio à nobre missão que recebestes do Povo Maçônico do Brasil.
Hoje, conforme o regulamento geral do Grande Oriente do Brasil, no dia 24 de junho ocorre à posse do Grão Mestre Geral e seu Adjunto (lembrando que o pleito eleitoral é de cinco anos nesta Obediência), ocorre também a posse da mesa diretora, além do novo presidente da Assembleia Legislativa Federal. A mensagem do Grão-Mestre Geral que trata das atividades da Obediência relativas ao exercício anterior é feita no mês de março (GOB, 2008).
Augúro que sabereis encontrar para as necessidades de nossa Sublime Ordem os remédios mais acertados e que adoptareis sábias resoluções, que lhe abram novas e mais largas vias de progresso.
No manifesto dirigido aos Maçons da Federação, no momento em que assumi as funcções dos cargos que seus votos unanimes me confiaram, já que tive ocasião de agradecer-lhes a distincção de sua magnânima generosidade.
Nesse documento disse tambem, em rapidas palavras, o que mais nos cumpria fazer continuando a obra dos que nos antecederam, obedientes aos principios basicos de nossa Sublime Instituição.
Do vosso concurso muito depende a marcha feliz dos nossos trabalhos communs. A Ordem muito espera de vossas luzes e da vossa dedicação. Para corresponderdes a essa justificada esperança não vos há faltar fé nos nossos destinos, nem perseverança na lide necessaria.
Tereis presente ao pensamento que a Maçonaria tem por objectivo final a felicidade humana, só alcançável quando a suprema ascendencia do sentimento da fraternidade for aceita por todos os cérebros e se abrigar em todos os corações.
Pugnar por esse ideal sublime é o nosso dever, que sentimos tanto imperioso quanto maiores forem as dificuldades a vencer e mais remota nos pareça sua realisação.
Iremos, com a ajuda das conquistas conseguidas em todos os ramos do saber, armados com as verdades demonstradas pela sciencia, animados do grande desejo de união e concordia, illuminando os espíritos e enlaçando os homens na communhão de um só pensamento, de uma mesma aspiração.
Não importa que pareça uma utopia o que buscamos, por que, em busca-lo, alguma cousa havemos de alcançar de útil e proveitoso á Humanidade. Foi das chiméras da astrologia e da alchimia que surgiram as leis fundamentaes da astronomia e chimica.
No parágrafo acima, Nilão (Ultra High Mason), nos ensina que o dito popular “uma andorinha só não faz verão” é pura balela, afinal, qualquer coisa feita para o bem, por menor que seja é útil e ajuda na caminhada do progresso.
Propagando as verdades que a sciencia tem demostrado, instruindo, é que havemos de contribuir para que se implantem os principios Moraes que hão de fazer a felicidade dos homens e dos povos, unindo-os todos numa só família.
Toda a moral social, disse Emile Littré, se resume nesta formula: Instrui-vos, instrui aos outros.
A disseminação do conhecimento pode e deve ser sublimado sempre quando possível, afinal a instrução eleva o espírito do homem, e como Einstein disse “Lembre-se que as pessoas podem tirar tudo de você, menos o seu conhecimento.”.
Imagem de Decreto Recompensando Loja Maçônica pela Criação e Manutenção de Escolas proveniente do Museu Maçônico Paranaense. Disponível em: https://www.museumaconicoparanaense.com. Acesso em Julho de 2018.
Instituição universal, a Maçonaria, uma e indivisivel pelos seis ideaes, forma uma grande todo pela harmonia de seus orgãos funccionaes. A cada um delles cabe o desempenho de uma missão particular no terreno da sua actividade, contribuindo para a conservação do corpo social e para a realisação de seus fins.
Cumpre-nos exercer a nossa atividade maçônica neste grande Brasil hospitaleiro, Patria extremecida de quase todos nós.
Aqui, pois, é que devemos batalhar a cruzada da instrução do povo, necessaria para que elle, prospero, forte e feliz, possa contribuir para a felicidade e progresso dos outros povos, libertando os escravizados, socorrendo os que carecem de auxílios, permutando fraternalmente com todos os benefícios opimos da paz e do trabalho.
Não poderíamos, pois, ser indiferentes deante desse grande e terrível cataclysmo que ha quatro annos abateu sobre a Europa, como um cyclone de insânia, que procurasse varrer da face da terra os monumentos todos da civilisação, pretendendo deter a marcha triumphal da democracia.
Para quem não pescou, Nilo Peçanha falava sobre a Primeira Guerra Mundial, que teve início em 1914 e só terminaria 3 meses após a apresentação deste texto.
São os nossos próprios ideaes que estão em causa, e que hão de sahir vencedores dessa pugna tremenda. Os esforços gherculeos do despotismo para abater o templo da liberdade hão de servir somente para revelar sua impotencia aos que ainda creem possivel o predomínio da força sobre o direito, e a conservação do regimen das castas privilegiadas, exploradas do povo sofredor e submisso.
Cada dia que passa, quanto mais cresce o numero das cidades destruídas, quanto maiores as ruinas accumuladas, dos templos, das usinas, dos palacios e das choupanas arrazados, quanto maus de avolumam os destroços materiaes que a furia dos combates faz crescer, maiores são tambem as victorias Moraes dos que se batem pelas conquistas da civilisação, mais alto se erguem os monumentos dos espíritos e do coração dos homens que estão luctando pela liberdade das Nações.
Cada hora de soffrimento tem registrado um passo mais no progresso dos principios sociaes que abraçamos e propagamos.
É a liberdade proclamada base necessaria dos organismos politicos, como principio de justiça para os homens e garantia de paz para os povos.
É a igualdade de direitos conferida a todos os homens, sem distincção de classes, pela justa compreensão do valor individual, revelado pela necessidade do emprego da atividade de todos para a victoria da mesma grande causa.
É a fraternidade dos povos despertada pela necessidade de união das forças para o combate ao adversário commum.
É o trabalho, em todas as suas modalidades, considerado como um nobre dever social.
É o horror pela violência, impresso nos corações dos prorprios contendores, pelos soffrimentos experimentados por todos.
É, finalmente, ancia tão grande e tão profunda pela paz definitiva, que se póde esperar que ella não será mais perturbada de futuro.
As nações se vão entendendo, como membros de uma só familia e , esquecidos os resentimentos que antigas luctas lhes deixaram, dão-se as mãos fraternalmente, irmanadas na mesma pugna de que depende a sorte de todas.
Infelizmente aqui, Nilo teve sua previsão errada já que 21 anos depois estourou a Segunda Grande Guerra… Com uma Alemanha muito ressentida governada por um líder lunático.
É, dentro de cada paiz, cada individuo, animado do mesmo espirito de sacrificio, do mesmo devotamento e do mesmo ardor pela vitória de causa que é de todos, consciente do valor da intima união depende a salvação da sua Patria.
É a Democracia Triumphante na grandeza de seus postulados, que um a uma vão impondo e vão substituindo os velhos preconceitos dos systemas politicos anachronicos.
A democracia é preceito importante dentro da filosofia maçônica, afinal independente do regime político profano, onde quer que esteja uma Loja Maçônica, as escolha de seus oficiais é feita de forma democrática.
Desenvolver aqui o valor do individuo, parcella de nossa Patria, é o que nos cumpre, para fazermos que ella seja tambem um membro importante da grande familia composta de todas as Patrias.
Instruir o povo é o único meio de dar-lhe o valor necessario e de conserguimos que se realise a reforma dos costumes, indispensável ao bom funcionamento do regimen politico que adoptámos, e, consequentemente, ao progresso do Paiz.
Em todos os tempos foi reconhecida a influencia dos costumes sobre a liberdade e conservação dos Estados e dahi estes adágios, tantas vezes repetidos, que as leis não valem nada sem os costumes, que os costumes são a chave da abóboda da legislação e que, depois de haver dado leis a um povo, nada ainda estará feito, si não forem creadas instituições que possam modelar o espirito e o coração dos governados sobre o principio e a fórma do governo adoptado.
Tendo nós adoptado o princio democrático e a Republica como a fórma de governo, tendo dado ao povo o governo da Nação e aos cidadãos o direito de exercer esse governo, tendo adoptado o regimen que sugio da Revolução franceza, carecemos, antes de tudo, resolver o problema da instrucção publica, o primeiro que ella achou necessario resolverpara, reformado os costumes, elevar o povo á compreensão, á pratica e ao goso das conquistas realizadas para elle por essa plêiade de pensadores e philisophos que formularam e proclamaram os direiros do Homem.
São de um famoso relatório de Jacquemont as seguintes palavras com que elle formulou no anno X esse problema fundamental da democracia:
“As virtudes Moraes que devemos de ora em deante cultivar não são mais as que pertencem a formulas particulares do governo e cujas regras arbitrarias foram traçadas pela mão do legislador. São as que a razão indica, que a experiencia ensina, que o senso intimo proclama, e cujos preceitos estão gravados em todos os corações pela mão bemfeitora da natureza. Seu effeito geral é o de augmentar a somma da felicidade individual: ellas não estão, pois, em opposição com os pendores naturaes; devem nascer por si mesmas, sob os rais vivificantes da razão publica. Apenas é necessario, portanto, esclarecer os homens para prendel-os a seus deveres legitimos, a seus interesses verdadeiros, a todos os elementos da felicidade geral e particular; em uma palavra, pe das luz communs e de sua diffusão nas diversas classes da sociedade, que dependem a liberdade, a independencia, a tranquilidade e a prosperidade das nações livres. É, pois, para a instrução que devem ser dirigidas de preferencia as nossas vistas.”
Foi, assim, formulado o problema da instrucção publica pela Revolução Franceza. Qual deve ser o seu objetivo ella o indicou a 20 de abril de 1792 neste programma admirável, traçado por Condorcet, o mais illustre dos membros da Aseembléa que tomaram parte nos debates memoráveis sobre tão relevante matéria:
“Offerecer a todos os indivíduos da espécie humana os meios de prover ás suas necessidades, de garantir seu bem estar, de conhecer e de exercer seus direitos, de compreender e de cumprir seus deveres;
Assegurar, a cada um delles, a facilidade de aperfeiçoar sua indústria, de se tornar capaz das funcções sociaes, a que tem direito de ser chamado, de desenvolver todos os talentos recebidos da natureza; por esse meio, estabelecer entre os cidadãos uma igualdade de facto e tornar real a igualdade politica, reconhecida pela lei;
Tal deve ser o primeiro fim de uma instrucção nacional; sob este ponto de vista, ella é para o poder publico um dever de justiça;
Dirigir o ensino de modo que a perfeição das artes augmente os gosos da generalidade dos cidadãos e o bem estar dos que as cultivam; que um maior numero de homens se torne capaz de bem exercer as funcções necessaria a sociedade; e que o progresso sempre crescente das luzes abra uma fonte inesgotavel de socorros ás nossas necessidades, de remedios aos nossos males, de meios de felicidade individual e progresso comum;
Cultivar, emfim, em cada geração, as faculdades phisicas, intellectuaes e Moraes, e, por esse meio, contribuir para o aperfeiçoamento geral e gradual da espécie humana, ultimo fim para o qual toda a instituição social deve ser dirigida;
Tal deve ser o objeto da instrução, que é um dever imposto pelo interesse commum da sociedade e de toda a humanidade.”
Indicada a necessidade da instrução do povo, determinado os seus objetivos, si fossemos agora examinar a quem cabe o dever de diffundil-a no Brasil, concluiriamos que essa missão não compete só aos Poderes Publicos, porque ella deve ser uma obra nacional realizada pela collaboração de todos os patriotas, e, sem esforço teríamos de confessar que a ninguem mais que á Maçonaria é imperioso o cumprimento desse dever.
Factor predominante da proclamação de nossa Independencia, magna pars em todos os passos que a nação deu para a frente até a implantação do regimen politico que nos rege, a Maçonaria assumio responsabilidades a que se não pode escusar, como não poderia, sem desmentir o seu passado, renunciar á honra de cooperar intensamente na na redempção dos espiritos que a ignorancia traz encarcerados.
A Ordem já vinha de longe sentindo pendor para essa cruzada, que já fora pregada pelo grande Maçon e nobre compatriota que me antecedeu no seu Governo Supremo.
Nesse caso em específico pode ter sido tanto o Lauro Sodré que foi seu antecessor e que através do decreto 491 de 1914 permitiu que se negociasse com duas instituições para instalação de dois internatos de ensino primário, secundário e ensino técnico, ou o Veríssimo José da costa que estava em 1917 como Grão Mestre Interino e que na mensagem a Assembleia Geral no citado ano também previa a criação de Escolas na sede Grande Oriente do Brasil.
Coube a mim proclamar, como fiz no manifesto inaugural, auscultando as necessidades do nosso povo e sentindo as aspirações da nossa Ordem que era chegado o tempo dessa campanha pela instrucção, de querel-a como anceio máximo dos nossos corações, de fazel-o o objecto principal das nossas lides: e de lidal-a com vigor maior das nossas forças.
Não foi em vão esse appello. Vão ahi adiante nos documentos annexos detalhados os fructos que desde então já pudemos colher neste primeiro período em que me achei absorvido em ser á pátria noutro posto que as circumstancias gravaram das mais pesadas responsabilidades.
Trinta e seis escolas foram creadas por varias Lojas, em diversos pontos do Paiz, no curto espaço dos últimos dez mezes. Neste momento, em mais de 60 escolas mantidas pelas Lojas Maçonicas, cerca de 4.000 creanças e adultos recebem instrucção gratuita no Brasil.
Imagem proveniente do Museu Maçônico Paranaense. Disponível em: https://www.museumaconicoparanaense.com. Acesso em Julho de 2018.
Outras escolas estão em via de formação, inclusive um instituto profissional neste Oriente.
Além disso, varias Lojas distribuíram a alumnos de escolas minicipaes e particulares, prêmios diversos em medalhas de ouro e cardenetas de depósitos nas Caixas Economicas, algumas continuam mantendo bibliotecas, outras realisaram interessantes conferencias publicas, ou prestaram auxilios em dinheiro, trabalho e cessão de local a escolas de iniciativas profanas, e, si não nos esquecermos, dos asylos, hospitais, dispensários e socorros mantidos pelas Lojas, havemos de reconhecer que, fez, emfim, cada uma aquillo que suas forças permittiram.
Algo que é muito interessante salientar, aproveitando a fala de Nilo Peçanha é que, além de Materiais didáticos, cesta básica e produtos de limpezas, instituições de ensino mantidas por associações beneficentes, Lojas Maçônicas e afins precisam de dinheiro (grana, la plata) para custear aluguel, manutenção e outras despesas indispensáveis.
E, visto que novos obreiros e muitos dos que se haviam retrahido estão vindo cheios de enthusiasmo, attrahidos pelo encanto da tarefa em que nos empenhámos, que novas Lojas se fundam e outras se reerguem ao rumor dessa bemdita campanha, não podemos ter, sinão motivos de satisfacção e de maiores esperanças de que a Maçonaria mais uma vez saberá cumprir o seu dever.
Tão vasto é. Porém nosso Paiz e tão grande p número de analfabetos, que é indispensável mais e mais intensificar a propaganda pela instrucção e augmentar os meios de leval-o a termo.
O systema de ensino mutuo, que multiplica a acção de cada professor, desdobrando-o em tantos. Outros quantos aos mais atrazados as noções que lhes dá diretamente , poderá ser muito útil á mais rápida divulgação da instrucção primaria, sobretudo nas localidades do interior do Paiz, onde mais raros hão de ser os que se possam entregar á nobre tarefa do ensino.
E ainda, noutros pontos, hão de ser necessários professores ambulantes, verdadeiros missionários das liberdade, que irão arrancar o povo da servidão em que se mudou a escravidão abolida, encaminhando-o para que possa completar, em todas as sua phases, a evolução gradual porque passaram os povos maus adeantados.
É preciso, porém, ter sempre presente que o fim principal da instrucção é fazer o cidadão útil a si mesmo e á comumunhão social.
É imprescindível, pois, que ella seja dirigida de modo a preparal-o para a grande cooperação na existencia comum, tornando impossivel a produção desses condemnavéis parasitas, que vivem só para si, como si tudo existisse só para seu goso, desses de quem Metasio disse, com justeza, que até de nascer não foram dignos,
“. . . . . che né pure
Di nascer mertó chi d’esser nato
Crede solo per se.”
Instruir para educar, deve ser nosso objetivo.
Deveria ser incorporado ao nosso Lema hoje!
É, pois necessario que a instrução da infância seja confiada á dedicação da mulher, porque é nessa phase da educação do homem que se torna mais precioso e imprescindivel o concurso feminino; é a phase em que se lançam no seu coração os germens dos sentimentos que hão de inspirar seus actos em todos os períodos da vida.
Nessa primeira phase a mulher, incutindo no espirito do infante as virtudes domesticas, o apego á Familia, prepara-o para o amor á pátria e á humanidade.
Á adolescência demos um officio, ensinemos o trabalho; preparemol-a para artífice de grandeza moral e matéria da nossa Patria.
Escolas profissionais de todos os ramos da atividade pratica, divulgadoras das applicações da sciencia ao trabalho é o que de mais carece o adolescente brasileiro, que se deve adestrar para exercer sua atividade intelligente nas officinas, nas fabricas, no commercio, na lavoura, em tudo quanto sirva ao progresso economico do Paiz, adquirindo um valor próprio e definido, que lhe faça ver em si mesmo, e não no Estado, a Providência dos seus dias.
Á mocidade outros cursos não são precisos para a progressão dos seus estudos, mas, é imprescindível que se adestre para a defesa da Patria, completando, assim, o aprendizado cívico que começa nas escolas maternaes.
Veja bem, é preciso analisar de forma fria o que se quis dizer aqui. Ele não disse que a mocidade (depois da adolescência) não precisa ou merece educação, tanto é que a proposta é para escolas noturnas para adultos também. Ele se refere que após o estudo técnico na adolescência que se complete a formação cívica no serviço militar obrigatório. Eu particularmente não sou adepto da teoria do serviço militar obrigatório, mas lembrem de que nessa época a Europa estava em guerra, podendo afetar a opinião na necessidade de defesa.
Num paiz como o nosso, cuja leis proscrevem as guerras de conquista e instituem o processo da arbitragem como meio de resolver suas questões, o preparo militar da mocidade, tendo só por destino a manutenção da ordem interna, a defesa da soberania da nação e da integridade do seu território, constitue ainda um meio de cultura das virtudes cívicas.
O preparo para o sacrificio pela Patria até da própria vida fal-a sentir mais preciosa que a mesma vida e servil-a na paz com mais amor.
O encontro dos jovens de todas as classes na tarefa commum de se instruírem, sob a mesma farda, igualados todos na mesma fileira, deante do mesmo symbolo sagrado, tremulante ao som dos mesmos hymnos, prende-os naturalmente em laços de affecto fraternal e avigora nelles o espirito da nacionalidade que é, na frase de Pasquale Mancini, “a manifestação collectiva da liberdade”.
Aqui ainda ele prega o serviço militar para todas as classes, ou seja, ele não faz distinção e ainda exalta a igualdade e o espírito de fraternidade.
O cidadão que, assim, for preparado há de ser cioso (apegado) de seus direitos politicose e zeloso cumpridor dos seus deveres, não permitirá que se esbanje a fazenda publica, nem quererá viver á custa dela, exigirá que se falseie o voto popular, pedra angular do regimen, há de exercel-o, com escrúpulo severo, dando-o só aos mais capazes e mais dignos de fazerem a felicidade da Nação.
Temos, pois, o dever de concorrer tambem quanto possamos para que a mocidade acorra a colher esses fructos magníficos da instrucção militar.
Não é tambem menos necessário, que emprestemos o prestigio da nossa palavra e do nosso exemplo a essa outra campanha que se prende ainda ao problema da instrucção e educação do povo: o da cultura da terra.
Bata só reflectirmos quanto deve ser precária a liberdade de uma Nação que depende de outra para viver, porque não produz o alimento todo de que carece.
E, si attendermos que nosso Paiz poderá ser o celeiro dos outros povos, si lhe quisermos trabalhar o sólo abençoado, si nos lembrarmos das populações que estão soffrendo fome por mingua de alimentos que nossa terra pode produzir em abundancia, sem grande esforço nosso, havemos de concluir que isso constitue, neste trágico momento da Historia, um dever sagrado que o sentimento da solidariedade humana exige de nós.
Trabalhemos, pois, nossa terra com amor, disso depende sermos um povo rico ou mendicante, depende a prosperidade do Brasil e a importancia do seu logar no concerto das Nações.
Aqui ele exalta a necessidade de sabermos manusear a terra, de forma a valorizar a mão de obra no campo, elevando a condição do Brasil perante o cenário internacional.
Eis, senhores membros da Soberana Assembleia Geral, o que á Maçonaria do Brasil cabe fazer de mais urgente, continuando fiel ao seu grande passado, em harmonia com a funcção que os outros orgãos da Sublime Instituição vão exercendo nos outros paizes, em prol do aperfeiçoamento e da felicidade humana.
Para obra tão grande e magnífica, carecemos multiplicar o número de nossos obreiros e apurar bem a sua qualidade, cuidar muito zelosamente da disciplina interna de nossos templos, da observancia rigorosa de nossas leis e dos nossos rituaes, que conservam a poesia do passado tradicional da instituição, sem lhe impedir a evolução fatal de todos os organismos sociaes.
Aqui Nilo Peçanha reforça a ideia de que quanto mais obreiros, mais força há para realizar sublimes projetos, porém fazer isso com prudência sempre observando rigorosamente nossas Leis e ensinamentos Morais contidos em nossos Rituais.
É, a par disso, façamol-a mais conhecida para melhor ser julgada tanto dentro dos nossos proprios templos como fora delles, porque não só pelos profanos, mas ainda por muitos irmãos ella não é exactamente comprehendida e não poderá ser assim, bem praticada.
O preconceito religioso ainda é muito explorado contra ella, em quem não poucos, acreditam ver inimiga de uma religião, quando ela abriga os crentes de todas e deixa todos a liberdade de suas crenças, que são por igual respeitadas.
Vemos aqui que independente da época, sofremos perseguições de religiosos sectários, por isso é importante que promovamos diálogos entre nós e a sociedade de forma a desmistificar pensamentos errôneos tão danosos a nós maçons.
Levantada uma vez essa imputação insidiosa pelo fanatismo intolerante, uns a repetem por simples automatismo, outros por convicção incutida pela audição continuada da inverdadade.
A uns e outros bastaria citar nomes ilustres dos que têm sido ao mesmo tempo benemeritos maçons e devotados membros de seu clero.
Inimigos somos da intolerancia e do fanatismo, dessa tyrannia das consciencias, como somos inimigos de todas as tyrannias politicas, em todas as suas fórmas e manifestações.
Nossos templos são officinas em que todos trabalham para o bem da Humanidade, sem os dissidios que dividem os homens no mundo profano, nelles não chegam os écos das luctas que se travam fóra, sinão para reclamar os remedios ás dores que ellas causam; a propria guerra, que destróe Nações inteiras, não se prolonga dentro delles, porque nelles véla pela paz o espirito da concordia, inspirando a todos os obreiros o sentimento da fraternidade, tão sincero e tão bello, que até mesmo no ardor das mais rudes pelejas elle perdúra, quando, acaso, acontece, dois maçons se defrontarem.
Nossa missão é grandiosa e sublime, avante, pois, senhores Membros da Soberana Assembléa Geral, continuemos nossos trabalhos pela Ordem, pela Patria, pela Humanidade.
Rio de Janeiro, 24 de Junho de 1918
Nilo Peçanha, 33°
Conclusão
Dário Veloso em um texto intitulado “Educar os Obreiros é a base da realização maçônica” também publicado em Boletim do Grande Oriente do Brasil, só que no ano de 1913 já fazia campanha para que se abrissem escolas noturnas e dominicais para a população, provando assim que a promoção do conhecimento foi um propósito da Maçonaria no começo do Século XX. Hoje ainda temos bons exemplos como o da Loja Maçônica Deus, Caridade e Amor, nº 37 que em parceria com a Prefeitura municipal de Itambé (BA) patrocinam a Escola Frei Caneca e no Rio de Janeiro o Instituto Conselheiro Macedo Soares que assiste meninas carentes de 04 à 12 anos oferecendo assistência médica, educacional e recreativa, mas infelizmente esse tipo de ajuda anda em baixa na Maçonaria Tupiniquim. Quem sabe o resgate desse passado glorioso não anima os nossos espíritos a fazer mais e mais pela nossa sociedade contemporânea.
Alunos da escola Frei Caneca na Semana do Trânsito realizada em 21 de Setembro de 2016. Disponível em: https://deltabahia.com.br/escola-frei-caneca-participa-da-semana-do-transito/. Acesso em Julho de 2018.
Referências
Site do Museu Maçônico Paranaense. https://www.museumaconicoparanaense.com. Acesso em Julho de 2018.
Site do Grande Oriente do Brasil. https://www.gob.org.br/nilo-procopio-pecanha-7o-presidente-da-republica-do-brasil/. Acesso em Julho de 2018.
Site da Câmara dos Deputados. https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-7566-23-setembro-1909-525411-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em Julho de 2018.
GOMES, Luiz Claudio Gonçalves. IMAGENS NÃO COTIDIANAS: Escola de Aprendizes Artífices de Campos (1910 – 1942). Disponível em: https://www.bdtd.ndc.uff.br/tde_arquivos/2/TDE-2004-11-16T15:23:52Z-47/Publico/Dissert-Texto%20completo.pdf. Acesso em Julho de 2018.
Site Afro Museu. Secretaria de Cultura do Governo do Estado de São Paulo. Disponível em: https://www.museuafrobrasil.org.br/pesquisa/hist%C3%B3ria-e-mem%C3%B3ria/historia-e-memoria/2014/07/17/nilo-pe%C3%A7anha. Acesso em Julho de 2018.