Categorias
Blog

A Necessidade da Dramatização nos Rituais Maçônicos

Para quem faz parte da fraternidade, está familiarizado com uma série de cerimônias que são replicadas em cada Loja Maçônica,  como uma espécie de teatro. Encenações, personagens, falas e textos fazem parte de nosso cotidiano. 

Para entender melhor como essa prática teatral na foi parar na Maçonaria, vamos recorrer a livro “Revelando o Código da Maçonaria” de Robert Cooper. Esta obra nos informa que na idade medieval, cada corporação de ofício (Ferreiros, marinheiros, vendedores de vinho e claro, os pedreiros), ensinavam seus segredos e mistérios através dos seus instrumentos de trabalho, e de alegorias bíblicas. Explica-nos também que em Haddington na Escócia, essas corporações faziam representações da narrativa bíblica ao público em geral em algumas ocasiões especiais, como era o caso da festa de Corpus Christi. 

Ainda falando sobre teatro na época medieval, Alexandre Mate em seu artigo “Evolução do Teatro Medieval” cita Vilma Areias dizendo que as corporações de ofício apresentavam peças bíblicas em palcos ao redor de praças, cujo objetivo era dramatizar o caminho do homem da gênese ao Apocalipse e que cada corporação ficava responsável por um episódio, incluindo a vida de Santos. 

Representação do Teatro Medieval

A Maçonaria, como bem sabemos, quer descendente, ou quer inspirada nas guildas de pedreiro, utilizam de interpretação de cenas, para ensinar e exemplificar conteúdos até os dias de hoje. Mas indago aos meus queridos leitores: Será que verdadeiramente nos dedicamos a interpretação e a dramatização das falas e passagens em nossos rituais?

Independente da resposta, muito de vocês devem estar refletindo sobre o assunto, ou até se defendendo explicando que não necessariamente as peças na era medieval eram feitas com qualidade. Porém existem dois fatores que contribuem eu acreditar que as dramatizações e posteriormente a maçonaria escocesa tivessem seus atos executados no mínimo de forma proficiente, ou feita de cor. Primeiro, quase ninguém era alfabetizado na idade média. Segundo, como vimos em meu texto sobre arte da memória, já em 1599, nos estatutos que regulavam a profissão de pedreiro, já previa a memorização dos ensinamentos daquela guilda, sob pena de multa.  

Segundo Estatuto de Schaw de 1599, onde estabelecia multa para os maçons que não fossem proficientes na arte. Ao lado a Marca de Pedreiro de William Schaw. Fonte: O Prumo de Hiram.

Tendo em vista os pontos abordados, explico como cheguei a essa reflexão. Lendo a biografia de George Lucas me deparei com o seguinte relato:

Apesar de ter sido criado como metodista, ficara mais intrigado com as cerimônias da igreja luterana alemã de Till, onde os fiéis ainda usavam chapéus largos e toucas e falavam em um tom carregado de sotaque e reverencial. Lucas era fascinado pela formalidade das cerimônias deles, muito parecidas com uma peça elaborada em que todos sabiam seus papéis. 

George Lucas – Uma Vida, por Brian Jay Jones.

 

Então eu pensei “Oras, existe muito desse sentimento dentro da maçonaria em relação a execução de práticas litúrgicas.”. E cá estamos! Se uma pessoa se aproxima ou se afasta de religiões pela observação da coesão de seus agentes ao realizar um ritual, provavelmente aconteça na maçonaria também. Mas não paramos por aí, pense no seguinte, você assistiria uma peça de teatro em que atores insossos se atrapalham nas falas, que de tempos em tempos precisam recorrer ao texto escrito, e mesmo assim ainda fazem uma leitura sofrível? Imagine agora um show de mágica com um profissional trapalhão que gagueja, revela seus truques tirando a surpresa do show e ainda fica perguntando a seu assistente qual o próximo número que deveria realizar. Você pagaria ou ficaria contente ao assistir um entretenimento desses? Acredito que a resposta para ambos os casos é não! 

Em minha casa também acontece algo parecido. Eu e minha esposa temos o costume de ler para nosso pequeno filho, mas ele sem titubear, pede para o papai ler suas histórias favoritas. Mas por quê? Eu diferente de minha esposa, dramatizo as leituras, dou vozes diferentes aos personagens, sentimentos de euforia a angustia, e a cada trejeito cômico, Átila aprova com uma gargalhada. 

Levando em consideração as situações expostas, acredito que na maçonaria não seja diferente. O maçons em geral querem sessões “redondas” e fluidas, e não atrapalhamentos, falta de coesão e leituras sofríveis. Há a necessidade de dramatizarmos melhor nossas sessões!

 

Façamos como no “Dança dos famosos”

Infelizmente nós maçons pecamos ao realizar a ritualística sem vontade, de forma truncada e leituras mal feitas,  mas também reconheço que grande parte de nós não são atores, ou artistas profissionais, mas isso não impede de fazermos o mínimo para uma liturgia descente. Por isso minha proposta é nos espelharmos no programa “dança dos famosos” que tem suas temporadas exibidas no Faustão. 

Antes de me julgarem maluco, vamos aos fatos. A Dança dos Famosos, como já diz o nome é um programa em que famosos disputam um campeonato de dança. Então temos pessoas de diversas áreas ensaiando e se esforçando para apresentarem um bom número aos jurados e talvez conseguirem uma boa nota, passando assim a uma próxima fase. Entre os participantes já tiveram atores, cantores e esportistas no geral. 

Na terceira temporada do programa teve como ganhador, o atleta Robson Caetano. E é esse caso em especial que vamos tomar como exemplo! Para quem não viu, segue um vídeo de uma das apresentações do atleta. 

Visivelmente vemos uma pessoa saindo de sua zona de conforto, se esforçando ao máximo para que todo o número ocorra com perfeição. Não vou entrar no mérito aqui se o cara é sem jeito, “duro”, ou sem talento para dança, mas vamos exaltar o esforço. Robson Caetano com certeza não é um bailarino profissional, mas ao se propor participar do programa, ele se preparou e ensaiou com o máximo que podia de forma a conseguir um resultado satisfatório. 

Fazendo um paralelo com a maçonaria, os maçons que durante qualquer cerimônia executam os cargos de oficiais da oficina, não precisam ser atores natos, mas devem ao mínimo fazer um esforço para bom proveito dos demais. Algumas boas práticas podem ajudar nisso, como:

  • Ler anteriormente o Ritual, para que na hora da cerimônia, não engasguem com palavras pouco usuais;
  • Memorizar o Ritual, ou as passagens principais da cerimônia a ser realizada;
  • Realizar laboratórios, ou seja, sessões de ensaio com todos os oficiais da Loja. Isso trará coesão aos membros da oficina e proporcionará uma melhor experiência aos demais participantes;
  • Para quem tem dificuldade na leitura, sugiro ler o Ritual em casa, ensaiar, e ao realizar a leitura em loja, primeiro digerir a informação, e depois passa-la com a maior clareza possível. 

Dito isto, acredito que todos que amam nossa Augusta Fraternidade tentam sempre realizar os trabalhos com o maior esmero possível, porém citando minha mãe, sempre é possível melhorar o bom. 

 

Referências:

COOPER, Robert. Revelando o Código da Maçonaria. [Tradução Urian Gebara da Silva] – São Paulo: Madras, 2009.

 GÊNEROS TEATRAIS DO TEATRO MEDIEVAL. Disponível em: http://www.teatro­semcortinas.ia.unesp.br. Acesso em Março de 2017.

 JONES, Brian Jay. George Lucas: Uma vida. Rio de Janeiro, 2017.

Imagem Representação do Teatro Medieval. Disponível em: https://static.todamateria.com.br/upload/56/9e/569eccbd86384-teatro-medieval.jpg. Acesso em outubro de 2019.

 

 

Por Cloves Gregorio

Cloves Gregorio, 37 anos, casado com a senhora Gislene Augusta, Pai do Menino Átila, Historiador, Professor e editor de livros, Venerável Mestre de Honra (Past) da ARLS UNIÃO BARÃO DO PILAR Nº21 Jurisdicionada ao GORJ, filiada a COMAB. Na Obediência já exerceu os cargos de Grande Secretário Adjunto de Cultura e Ritualística e Grande Secretário Adjunto de Comunicação e Informática.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *